O real ainda oferece o maior rendimento entre as principais divisas que são alvo de operações de arbitragem de taxa de juros no mundo, mas a deterioração nos fundamentos locais, associada ao fim do "boom" das commodities, em meio à perspectiva de redução de liquidez pelos Estados Unidos, tende a manter investidores ainda duvidosos sobre aplicar recursos na moeda brasileira.
É fato que todas as principais divisas de risco vêm sofrendo com a expectativa de mudança na política monetária americana - que poderá ficar menos expansionista até o fim do ano. Não à toa, a rentabilidade de operações de "carry trade" - quando se toma dinheiro num país com juro baixo para aplicar em outro com taxa elevada - com moedas do mundo emergentes vêm caindo. Mas o fraco crescimento, a inflação elevada e incertezas na área fiscal no Brasil têm piorado o desempenho do real na comparação com seus pares e contribuído para desestimular entradas de recursos, a despeito do ciclo de elevação da taxa básica promovido pelo Banco Central.
Levantamento divulgado na semana passada pelo banco japonês Nomura mostrou que, pela primeira vez desde janeiro de 2010, a maioria das instituições financeiras consultadas na pesquisa afirmou que a moeda brasileira, até recentemente menina dos olhos dos investidores, "não é atrativa".
"Com base em nossa estimativa, o real agora está menos popular que o peso mexicano entre os fundos toshin [de varejo no Japão] que operam um conjunto de moedas", afirma a equipe de estratégia e pesquisa em câmbio do banco japonês.
Quando se observa o resultado de aplicações em real e em peso mexicano ao longo deste ano e a partir de recursos financiados com iene, fica claro o desempenho mais fraco da moeda brasileira. Em média, quem tomou empréstimos na divisa japonesa e comprou Letras do Tesouro Nacional (LTN) - título brasileiro prefixado que no início do ano pagava cerca de 7,12% ao investidor - teve rentabilidade anualizada de 10,9% nos seis primeiros meses deste ano. Esse ganho foi inflado pela valorização nominal do real ante o iene no acumulado do ano, que soma cerca de 3,6%.
Sem dúvida, trata-se de uma taxa bastante elevada, mas é apenas metade dos ganhos obtidos com papéis semelhantes do México. Pelo mesmo critério, uma aplicação no México renderia nada menos que 19,9%. Esse ganho deve-se principalmente à disparada de quase 15% do peso mexicano ante o iene no período. A taxa básica de juros mexicana está em 4%, enquanto no Brasil é de 8,5% ao ano.
O financiamento de aplicações nessas moedas em ienes segue vantajoso por causa da depreciação global sofrida pela moeda japonesa desde o fim do ano passado, quando as autoridades do país intensificaram a guerra contra a deflação e o baixo crescimento. Se o "carry" é feito tendo como moeda de financiamento o dólar, a situação é bem diferente e a fraca performance do real fica ainda mais clara. Quem aplicou em reais financiando-se na moeda americana perde no ano, até o momento, 4,8%. Já o investidor que preferiu o peso mexicano ganha no acumulado do ano 2,9%.
"No geral, o pessoal ainda está muito machucado no "carry" com real", diz o diretor de pesquisa para mercados emergentes nas Américas do Nomura, Tony Volpon, notando que a moeda brasileira continua recebendo fluxos de investidores de varejo do Japão, mas nada que seja determinante para uma reversão na tendência de queda da moeda. "Enquanto isso, os fundos hedge estão fora do mercado, preferindo não aplicar no real."
No ano, a moeda brasileira acumula depreciação de 9,9% ante o dólar. A lira turca, outra divisa bastante procurada para operações de arbitragem, cai 9,8% no período. O peso mexicano, por outro lado, sobe 0,21%, enquanto o dólar australiano registra o pior desempenho, com um tombo de quase 13% em termos nominais.
Profissionais lembram, contudo, que a queda maior do "aussie" (como a moeda australiana é conhecida) deve-se principalmente ao desmonte de posições recordes a favor da divisa, movimento deflagrado pela perspectiva de mudança na política monetária dos EUA. "É diferente do caso do real, que já não vinha recebendo tanto dinheiro como antes. A questão no Brasil é local, o que nos leva a crer que, num momento de risco, talvez a moeda fique atrás de seus pares", diz o gestor de um fundo estrangeiro com filial no Brasil.
A reticência do investidor em aplicar no real ocorre a despeito de o governo já ter desmontado várias medidas de controles de capital adotadas num momento em que o fluxo de recursos ao país era abundante e a maior preocupação era com o câmbio apreciado.
O rendimento embutido nos contratos de Non Deliverable Forward (NDFs) - contratos de moedas negociados no mercado de balcão e que, negociados no exterior, simulam uma aplicação no mercado doméstico - está por volta de 8,25% ao ano, ante 7,75% um mês atrás. O real paga melhor que o dólar australiano (2,91%), o rande sul-africano (5,67%), o peso chileno (7,02%), o peso colombiano (4,44%) e a lira turca (6,56%). "A questão é que, entre um rendimento menor e certo e um maior e duvidoso, o investidor prefere a primeira opção", diz o gestor.
Mas o cenário mais obscuro para o real não é unanimidade. Na avaliação do diretor de tesouraria do banco Pine, Alexandre Vasarhelyi, o Banco Central já deu provas de que defenderá o nível de R$ 2,30 por dólar e, assim, o risco de os ganhos com "carry trade" evaporarem com uma nova rodada de depreciação cambial ficam menores.
Na sexta-feira, o dólar comercial fechou em alta de 0,35% a R$ 2,2670. Já as taxas dos contratos futuros de juros fecharam em leve alta, mas mostraram uma queda na semana.