A realidade para a Bovespa mudou. E para pior. Segundo analistas, o cenário de Produto Interno Bruto (PIB) com crescimento mais fraco, taxas de juros mais altas e dólar mais forte traz mais incertezas para o mercado de ações. Em relatório, o Bank of America Merrill Lynch (BofA) afirma que o novo quadro reduz a visibilidade para a bolsa brasileira.
O Ibovespa reagiu a essa mudança e caiu 2,07% na sexta-feira, para 53.506 pontos, o menor nível desde 18 de abril, quando encerrou em 53.165 pontos. A queda acumulada em maio foi de 4,29% e no ano já alcança 12,21%.
Mas, apesar da correção recente, os analistas Felipe Hirai e Marina Valle, do BofA, dizem que o potencial de queda da bolsa pode ser limitado, pois os investidores já estão com posição abaixo do mercado em Brasil, a maioria dos riscos negativos já está precificada e, com a decisão sobre os juros, o BC recupera credibilidade.
Em nota de estratégia a clientes divulgada na sexta-feira, o J.P. Morgan permaneceu com sua visão neutra para Brasil e acima do mercado para o México. "O fato do México apresentar um crescimento maior, menor inflação, menores taxas de juros, câmbio mais forte e projetos de reformas estruturais que melhoram o crescimento de longo prazo colocam o país muito à frente do Brasil em fundamentos", diz a nota.
Mesma visão sobre o fundo do poço tem Paulo Bittencourt, diretor técnico da Apogeo Investimentos. Segundo ele, é difícil o índice Ibovespa negociar abaixo do patamar atual por muito tempo, já que as notícias negativas estão sendo absorvidas e apenas um novo fator de força deve provocar mudanças mais sensíveis. E esse fator, para ele, é o PIB do segundo trimestre, que vai demorar a sair.
A nova realidade da bolsa é desfavorável para setores que perdem com a desaceleração econômica, como construção civil e consumo. Companhias que oferecem defesa à inflação devem passar por uma venda forte no curto prazo, após a alta dos juros, dizem os analistas do BofA.
"Preferimos papéis baratos (Vale) sobre ações que já estão acima do mercado (itens de primeira necessidade)", afirmam. Os especialistas também não gostam de ações com "beta alto" [volatilidade] no momento, como construtoras, companhias do grupo "X", aço e ações de empresas com endividamento alto [dada a baixa visibilidade e altas taxas de juros] e dizem acreditar que as elétricas e teles não devem ter mudança de preço.
Para os especialistas do BofA, as ações de consumo são as maiores perdedoras no novo cenário. O crescimento fraco do PIB no primeiro trimestre, dizem, foi provavelmente gerado por uma expansão menor da renda real e aumento da inadimplência.
Na sexta-feira, os papéis de construção civil tiveram um dia para ser esquecido. Caíram fortemente Brookfield ON (-9,63%), Rossi Residencial ON (-8,97%), Gafisa (-6,62%) e Cyrela (-6,34%).
Ações do grupo "X" também estiveram entre os piores desempenhos. MMX perdeu 11,58% e OGX caiu 8%. Bittencourt, da Apogeo, comenta que o setor tem forte reação a oscilações no PIB, já que está intrinsecamente ligado a emprego e renda. "É um dos primeiros a sentir baques econômicos", comenta. De consumo, caíram com força B2W (-7,87%), Hering (-3,78%) e Lojas Renner (-4,33%).
Entre os setores que podem ganhar com a nova realidade, dizem os especialistas, estão bancos (taxas de juros mais altas), papel e celulose (exposição a um real mais fraco) e empresas com exposição à economia global. Embraer subiu 1,84%, com um cenário de real mais fraco.
Na opinião do estrategista da SLW Corretora, Pedro Galdi, os investidores estão descontentes. "A política monetária decepciona. Onde está o tripé que sustenta a economia?", afirma. Ele comenta que a inflação resiste, os juros deveriam ter sido elevados antes e o dólar bate máximas seguidas. "A queda do mercado [na sexta] foi desconfiança pura."