Para Krugman, é a obra que "vai mudar como pensamos sobre a sociedade e a nossa forma de fazer economia".
Eles estão falando do fenômeno "Capital In The Twenty-First Century" ("O Capital no Século XXI"), que está sendo debatido exaustivamente e chegou nesta semana ao primeiro lugar entre os mais vendidos da Amazon - um feito notável para um livro sobre desigualdade com 700 páginas.
Seu autor é Thomas Piketty, um francês de 42 anos que leciona na Paris School of Economics. Com a ajuda de colegas da Universidade de Berkeley, na Califórnia, ele passou mais de uma década reunindo dados sobre a distribuição de riqueza em mais de 20 países ao longo dos séculos XIX e XX.
Geralmente, esse tipo de levantamento é feito através de pesquisas como as do censo, que escolhem alguns domicílios por amostragem e extrapolam os resultados para a população total.
A inovação de Thomas foi olhar para as declarações de imposto. Como a elite acumula riquezas que vão muito além da renda do trabalho, essa é uma forma muito mais eficiente para diferenciar, por exemplo, quanto tem os 1% e os 0,1% mais ricos da população.
Sua conclusão: estamos voltando para um estado de "capitalismo patrimonial", no qual uma minoria vive de riqueza acumulada - e transmitida aos seus descendentes - enquanto todo o resto vive de trabalho.
Os salários nunca tiveram uma participação tão baixa no total da economia americana - e os lucros corporativos nunca tiveram uma participação tão alta.
Enquanto isso, o 0,1% mais rico do país tem hoje uma parcela da renda nacional maior do que em qualquer outro momento da história. Em outros países desenvolvidos, a situação é menos grave, mas similar (ele não dedica grande espaço aos emergentes).
A tese central de Picketty, a grosso modo, é que sempre que a taxa de retorno do capital supera a taxa de crescimento econômico, a riqueza se concentra nas camadas mais ricas da população.
De acordo com esta visão, as três décadas de ouro do capitalismo ocidental (os anos 50, 60 e 70) foram um acidente histórico. Duas guerras mundiais destruíram grande parte do capital e exigiram uma reconstrução que impulsionou o crescimento - acelerado ainda mais por um boom demográfico.
Enquanto isso, altos impostos sobre os ricos e a conquista de benefícios sociais seguravam a desigualdade.
Dos anos 80 para cá, o cenário voltou para seu padrão de baixo crescimento econômico e populacional e alta acumulação de capital, com o agravante de que o sistema tributário ficou menos progressivo por causa de sucessivos cortes de impostos para as camadas mais ricas da população.
Propostas
Picketty não tem medo de ser provocativo e rejeita a tendência dos economistas de evitar as grandes questões e focar em modelos matemáticos isolados das outras ciências sociais. O livro foi batizado com referência a "O Capital", de Karl Marx, e é cheio de citações literárias.
Apesar do diagnóstico sombrio, o autor rejeita uma "leitura apocalíptica" do livro e sugere formas de reverter a situação atual. Uma delas é mudar o sistema de impostos: reduzindo tributos sobre a propriedade de pessoas com renda baixa e criando um imposto global sobre riqueza na faixa dos 80% - além de atacar os paraísos fiscais.
Seus críticos tacham essas ideias como "radicais" e "irrealistas" no clima político atual, mas Picketty lembra que o próprio imposto de renda federal nos Estados Unidos parecia inatingível até poucos anos antes de ser criado, em 1913. Ele acredita que ficar de braços cruzados é colocar em cheque a própria democracia:
"Uma certa desigualdade é necessária para o crescimento, para criar incentivos, mas ela não pode se tornar completamente extrema (...) A evidência histórica que temos é que nossas instituições democráticas podem ser capturadas pelos grupos do topo muito mais facilmente quando temos uma concentração de renda extrema. Para mim, essa é a principal preocupação.", afirmou em entrevista ao site Vox.
Fonte: Exame