A inflação brasileira acumulada em 12 meses está em queda desde o quarto trimestre do ano passado, um fenômeno que se observou também em muitos países emergentes e desenvolvidos, mostrando uma tendência global de alívio da pressão sobre os preços. O nível mais baixo das cotações de commodities tem peso importante para explicar o movimento, também influenciado pela perda de fôlego da atividade econômica em diversos países, resultado de altas de juros promovidas especialmente na primeira metade de 2011.
No Brasil, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em 12 meses caiu de 7,31% em setembro de 2011 para 5,24% em março deste ano, na China, a inflação em março ficou em 3,6%, depois de ter atingido 6,5% em meados do ano passado. Nos Estados Unidos, caiu de quase 4% em agosto e setembro para 2,7% em março, com o núcleo, que exclui energia e alimentos, em 2,3%. Segundo analistas, a maior parte da queda da inflação global nessa base de comparação já ocorreu - agora, a tendência é de maior equilíbrio entre a inflação e ritmo de crescimento como foco de preocupação dos BCs.
Os preços dos produtos primários subiram com força nos últimos meses de 2010 e nos primeiros de 2011, jogando a inflação para cima em muitos países, lembra o analista-sênior para a América Latina da Economist Intelligence Unit (EIU), Robert Wood. Naquele momento, a atividade econômica global estava mais forte e, como diz o economista Raphael Martello, da Tendências Consultoria, a chamada Primavera Árabe colaborou para pressionar os preços do petróleo.
Essa trajetória "contaminou" os índices de preços em 12 meses até o terceiro trimestre do ano passado em grande parte dos países, com alta de alimentos e de combustíveis. A partir do fim de 2011, contudo, o período de inflação mais salgada - grosso modo, de outubro de 2010 a abril do ano passado - começou a "deixar" as taxas acumuladas em 12 meses, afirma Wood. Do segundo trimestre de 2011 em diante, os preços de commodities ficaram mais comportados, o que, de acordo com Wood, "explica em grande parte a tendência" de perda de fôlego dos preços em muitos países nessa base de comparação.
"No entanto, também houve um aperto monetário em alguns mercados emergentes em 2011", reforça o economista da EIU. Isso contribuiu para controlar a inflação, ao ajudar a esfriar a atividade econômica. O Banco Central brasileiro, por exemplo, elevou os juros básicos entre janeiro e julho do ano passado, de 10,75% para 12,5% ao ano, além de ter adotado medidas para restringir o crédito. O BC chinês aumentou as taxas do fim de 2010 a meados de 2011, enquanto a autoridade monetária da Índia promoveu 12 altas dos juros. Até mesmo o Banco Central Europeu (BCE) elevou as taxas por duas vezes no ano passado, porque a inflação em 12 meses superava a meta, de até 2%, uma atitude fortemente criticada por vários analistas, já que a zona do euro já passava por uma complicadíssima crise da dívida e a atividade se mostrava anêmica em muitos países do bloco.
A partir do fim do terceiro trimestre do ano passado, a preocupação começou a mudar da inflação para o ritmo de crescimento. A crise europeia se agravou e a atividade econômica de muitos países, entre eles a China, começou a desacelerar. Foi nesse cenário que o BC brasileiro inverteu a mão da política monetária, passando a cortar a taxa Selic em agosto de 2011 - desde então, caiu de 12,5% para 9% ao ano.
No Brasil, a queda da inflação não foi maior por causa dos preços de serviços, que rodam na casa de 8% em 12 meses, em boa parte refletindo um mercado de trabalho ainda aquecido. Em compensação, a Petrobras não reajustou a gasolina com base na oscilação dos preços internacionais do petróleo, contendo esse foco de pressão inflacionária. Em países como os EUA, lembra o economista da EIU, o nível elevado das cotações do petróleo no começo do ano impediu um recuo mais acentuado da inflação ao consumidor em 12 meses.
Hoje, o maior risco inflacionário para a economia global é o petróleo, avalia Martello. A tensão no Oriente Médio, com o temor de que Israel ataque o Irã, mantém elevados os preços do produto, mesmo num quadro de mais equilíbrio entre a oferta e a procura. Um conflito, diz ele, poderia fazer os preços dispararem. Além do risco do petróleo, Wood considera que a abundância de liquidez internacional também pode provocar bolhas especulativas nos preços de ativos, citando como outra possível fonte de pressão inflacionária uma eventual recuperação mais forte da economia americana, o que hoje lhe parece improvável.
Para os próximos meses, Martello acredita que haverá mais equilíbrio entre as preocupações dos bancos centrais com inflação e crescimento, com os índices de preços mais tranquilos do que em 2011. A tendência seria de mais estabilidade dos juros do que de movimentos para cima ou para baixo, diz ele, destacando, porém, as diferenças entre as ações dos bancos centrais.
O BC da Colômbia, por exemplo, elevou os juros duas vezes neste ano, por causa da demanda doméstica forte, decidindo pela manutenção da taxa em 5,25% ao ano na reunião de segunda-feira. Já o BC brasileiro indicou que pode continuar a reduzir a Selic, enquanto o da Índia começou a afrouxar a política monetária na semana passada.