No ano passado, o banco central turco conseguiu segurar a crescente inflação aumentando os juros e deixando a lira se apreciar 6% em relação ao dólar. O governo brasileiro, em contraste, empenhou-se em reduzir o fluxo de capital especulativo estrangeiro atraído ao país pela valorização do real e o alto rendimento da dívida pública. O valor do real caiu 11% e a entrada de dinheiro estrangeiro diminuiu.
Quem tem acompanhado atentamente essa evolução são investidores a meio mundo de distância: os japoneses que compram títulos no mercado "uridashi". Os títulos uridashi são vendidos a investidores japoneses em moeda nacional do emitente. Esse mercado totalizou US$ 19,5 bilhões em 2012, em comparação com US$ 21,8 bilhões doze meses antes, segundo dados compilados pela Bloomberg.
Negócios que envolvem tomar empréstimos no Japão, onde os juros são baixos, e investir os recursos em economias com taxas de juros maiores têm se tornado muito populares. Os títulos governamentais japoneses de 10 anos rendem apenas 0,81%, a segunda taxa mais baixa do mundo, depois da Suíça. Um investidor japonês usando essa estratégia é muitas vezes chamado de "Dona Watanabe", numa referência às donas de casa que controlam os orçamentos familiares e operam no mercado uridashi.
Dona Watanabe era uma grande fã do Brasil, mas passou a gostar mais da Turquia. No mercado uridashi, os títulos denominados em liras turcas vendidos a investidores japoneses individuais superaram os de todos os outros mercados emergentes no ano passado. O montante dos títulos uridashi emitidos em liras saltou 72% em 2012, para US$ 3,7 bilhões, perdendo apenas para títulos uridashi em dólares australianos, que somaram US$ 6,7 bilhões, segundo dados compilados pela Bloomberg. O valor dos títulos uridashi denominados no real brasileiro recuou 27% no ano passado, para US$ 3,05 bilhões.
Em média, os papéis em lira turca renderam quase o mesmo que os títulos brasileiros no ano passado: 8,5% no caso dos títulos brasileiros com maturação em dois anos, contra 8,0% para os títulos turcos de mesmo prazo. Mas os investidores japoneses estão obtendo melhores resultados com os papéis turcos desde que o governo brasileiro, com a intenção de manter sua moeda desvalorizada, passou a aplicar taxas e impostos a estrangeiros interessados em investir na dívida do país. "A Turquia deu aos investidores uma oportunidade de diversificarem, aplicando fora da América Latina", diz Mariya Gancheva, estrategista de mercados emergentes da Mitsubishi UFJ Securities International.
A ação do governo brasileiro para conter entrada de capital especulativo estrangeiro, combinada com mudanças regulatórias e o temor de que o real sofrerá mais desvalorização foram "o suficiente para que os investidores japoneses ficassem um pouco tensos", disse Win Thin, diretor mundial de estratégia para mercados emergentes na Brown Brothers Harriman, por e-mail. "O dinheiro novo está indo para outros lugares, como a Turquia."
Os investidores que tomaram empréstimos em ienes e compraram títulos denominados em liras turcas ganharam um retorno de 30% no ano passado. Eles lucraram com generosos rendimentos dos papéis e foram beneficiados por um impulso extra da valorização de 20% da lira em relação ao iene. Esse é o melhor desempenho em mercados emergentes depois do zloty polonês e do forinte húngaro. Os investidores que tomaram emprestados em ienes e investiram em dívida uridashi brasileira ganharam 9,8%.
Uma incógnita é quanto tempo os títulos turcos permanecerão populares entre os japoneses, à medida que os rendimentos declinarem. Em 25 de dezembro, o banco central turco reduziu para 5,5% o custo médio de financiamento pago a investidores, de 11,9% em 6 de janeiro de 2012, depois que o crescimento econômico esfriou para 1,6% no terceiro trimestre, nível mais baixo desde a recessão de 2009.
Enquanto a Turquia se preparava para baixar sua taxa de referência, a Fitch Ratings elevou a nota do país em moeda estrangeira em um nível, para "BBB-", citando uma queda do risco econômico e a redução do endividamento. O primeiro grau de investimento do país em 18 anos "deu muita confiança ao mercado", diz Gancheva, do Mitsubishi UFJ. Dona Watanabe poderá continuar comprando títulos turcos por mais algum tempo.