A desvalorização do dólar ante o real, associada a declarações da presidente da República, Dilma Rousseff, sobre a política monetária e a coletas de preços feitas por instituições particulares para agentes de mercado, levaram as taxas de juros negociadas na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F) para uma sessão de baixa ontem. O movimento afastou os contratos das máximas em dois meses, que foram registradas na semana passada, quando as pressões inflacionárias dominavam a atenção dos economistas.
Na lista dos contratos mais negociados na BM&F, o DI (Depósito Interfinanceiro) com vencimento em janeiro de 2014 fechou projetando taxa de 7,19%, contra 7,24% do pregão anterior após os ajustes. O DI de janeiro de 2015 desceu de 7,94% para 7,88%, e o DI com prazo em janeiro de 2017 recuou de 8,81% para 8,76%.
Segundo cálculos do economista-chefe do banco ABC Brasil, Luis Otávio de Souza Leal, ao permitir que o valor da divisa americana ceda de R$ 2,02 para R$ 1,95, o Banco Central consegue obter um efeito no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA, o índice oficial de inflação) da ordem de 0,20 ponto percentual. "O fato de o dólar ter rompido esse suporte sem o BC voltar a agir contribui para conter a pressão inflacionária e diminui, portanto, a probabilidade de um aperto monetário neste ano", disse.
O estrategista-chefe do Credit Agricole Brasil SA, Vladimir Caramaschi, trabalha com a mesma linha. Para ele, a autoridade monetária quer deixar claro que está atento ao comportamento da inflação e que vai usar um real mais forte para conter aceleração dos preços. Ele diz que merece atenção ainda o fato de dólar ceder após meses em que o Ministério da Fazenda defendeu um real mais fraco para estimular a indústria local.
O estrategista do Credit Agricole descarta um aumento de juros este ano no leque de instrumentos do BC para enfrentar um cenário em que a inflação resista a cair dos picos que já eram esperados neste primeiro trimestre. "Estou com o cenário de juros estáveis até o fim do ano porque se a inflação se deteriorar o BC vai usar medidas macroprudenciais e até o câmbio como primeiras alternativas para ancorar as perspectivas de inflação", diz.
Segundo Caramaschi, essa situação vai se prolongar até 2014, se as projeções para o IPCA não superarem o patamar de 6%. Mas em 2014 os juros vão subir por que o quadro de política expansionista e recuperação econômica não vão permitir um juro real tão abaixo do juro neutro, avalia.
O economista-chefe do Banco J. Safra, Carlos Kawall, pondera a tese de que o dólar mais fraco é sinônimo de instrumento do BC focado na inflação. Mas admite que o resultado é positivo na condução da política. "Considero exagerado dizer que a valorização cambial vai fazer as vezes da política monetária, mas o fato é que o conjunto de elementos que se vê no cenário reforça a ideia de estabilidade dos juros, que já era nosso cenário base."
Ele aponta que o dólar teria de ficar por um período prolongado em um patamar mais baixo para que houvesse efeito sobre a inflação. "E eu vejo o dólar mais perto de R$ 2,00 do que de R$ 1,95", afirma. "Acho que o governo não ficou satisfeito em ver o dólar perto de R$ 2,10, mas considero exagero dizer que o câmbio será usado como instrumento anti-inflacionário."
Além da tese de que o real forte virou peça na luta do BC para controlar a inflação, outro evento que ajudou a tirar as taxas de juros negociadas na BM&F das máximas em dois meses foram as declarações da presidente Dilma Rousseff sobre a política monetária. Durante encontro nacional com os prefeitos na segunda-feira, a presidente disse, após o fechamento dos mercados, que a redução da Selic "é um movimento importante", iniciado em um ambiente de "tranquilidade" e "com sensatez". "Temos condições macroeconômicas para fazer isso", afirmou.
Outro fator que também contribuiu para construir a tendência de queda dos juros projetados na BM&F ontem foi o resultado de coletas de preços feitas por institutos privados para instituições financeiras - e que acabam circulando no mercado. Nessas apurações, o IPCA caiu de 0,73% para 0,15% na ponta. Souza Leal, do ABC Brasil, observa que esse recuo é provocado, em grande parte, pela redução da tarifa de energia elétrica - fator que levou a instituição a rever de 0,95% para 0,85% sua projeção para o IPCA em janeiro.
Ainda assim, o dado tem efeito nos preços, reforçando a visão de que a inflação em fevereiro pode ficar mais branda. A queda dos preços das carnes, que já começa a ser observada, deve dar corpo a essa ideia. Souza Leal diz que a sua estimativa para o IPCA em fevereiro é de 0,40%, com viés de baixa.