Apesar do consumo ainda forte, analistas reduzem a 3,03% a projeção para a expansão da atividade econômica neste ano
Com a economia ainda sem dar sinais claros de recuperação, o mercado financeiro passou a apostar em um cenário que vai na contramão do que espera o governo para 2013. Em um intervalo de apenas uma semana, a expectativa para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) caiu de 3,10% para 3,03%, o mais baixo patamar já projetado para o ano, segundo a pesquisa Focus, divulgada ontem pelo Banco Central. É uma notícia ruim, que corrobora outro dado desfavorável, apurado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), mostrando a redução da confiança dos empresários no rumo dos negócios, apesar de todos os pacotes de estímulo montados pela equipe econômica na esperança de renovar o fôlego do setor. São indicadores que alimentam o pessimismo dos economistas, mas que escondem um intrigante paradoxo na economia brasileira.
Apesar das perspectivas que sugerem cautela com a retomada da indústria e dos investimentos produtivos, para o cidadão médio assalariado, o país tem ido muito bem. Com dinheiro no bolso, emprego garantido e farto acesso a crédito para parcelar compras a perder de vista, milhões de brasileiros têm aberto a carteira e garantido polpudos lucros a empresários do comércio e de outros segmentos ligados ao consumo, como salões de beleza, shopping centers e supermercados.
Os consumidores não parecem ligar para os alertas de que a inflação, ainda em março, deverá ultrapassar o limite de tolerância — 6,5% — estabelecida pelo governo para a inflação deste ano. Tampouco estão preocupados com a perspectiva de que os juros básicos devem subir 1 ponto percentual em 2013, segundo acreditam analistas ouvidos pelo Banco Central na pesquisa Focus também divulgada ontem.
Para técnicos do governo, mesmo com a Selic sendo elevada para 8,25% ao ano, é pouco provável que o consumidor deixe de gastar apenas por causa disso, algo que já não aconteceu nos últimos anos, quando a taxa era bem maior do que os atuais 7,25%. “São poucos os que se importam com os preços ou com a qualidade. O que as pessoas buscam são prazos maiores e prestações que caibam no bolso”, disse a comerciante Teresa Cristina Machado, 41 anos, que mantém há 15 anos uma loja de colchões e roupas de cama na Asa Norte.
Crise
Para muitos economistas, soa como um contrassenso um país com crédito farto e pleno emprego ter um setor produtivo em situação de fragilidade e uma taxa de investimentos em patamar abaixo de 20% do PIB, nível considerado insuficiente para garantir uma expansão econômica de 4%, como deseja o governo. Para a economista Zeina Latif, sócia da Gibraltar Consulting, o paradoxo se deve a uma série de fatores, sendo o mais relevante o aumento dos custos com fretes e mão de obra qualificada. “O custo de contratação encareceu muito nos últimos anos. Então quem tinha possibilidade de repassar preços o fez sem muita dificuldade, como o setor de serviços, que comercializa bens que não podem ser importados. Já a indústria sofreu bastante, porque a demanda elevada tem sido atendida, em boa parte, pelos concorrentes estrangeiros”, disse ela.
O Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) tem avaliação semelhante. “O varejo cresce muito bem desde 2004, mas a produção industrial cada vez mais caminha em um ritmo inferior”, afirmou a entidade, em um comunicado divulgado ontem “Tal descompasso cresce com a significativa penetração das importações no mercado consumidor brasileiro, refletindo também a significativa queda das exportações industriais. Em outras palavras, a diferença de desempenhos reflete a crise de competitividade da indústria brasileira”, completa a nota.
Com a escalada do consumo e o baixo crescimento produtivo — situação que levou à subida da inflação —, o Brasil entrou no que a economista Alessandra Ribeiro, da consultoria Tendências, classificou de “armadilha do baixo crescimento”. “A presidente Dilma Rousseff já percebeu isso e vem tentando puxar a economia por meio das concessões ou via aumento da produtividade, mas, com o horizonte cheio de incertezas, os investimentos ficam em compasso de espera”, afirmou.
Soma-se a isso, acrescentou o economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Thadeu de Freitas Gomes, a inflação beirando o teto da meta, o que reduz ainda mais as condições para a retomada da indústria e dos investimentos. Ele lembra que, diante dessa situação, no mercado as taxas de juros já subiram. “O BC ainda está ambíguo porque a economia ainda não recuperou a atividade. Mas pior que a atividade econômica não crescer é a inflação aumentar”, alertou.