A Bovespa tem chances de passar por recuperação técnica, após acumular perdas de 8,5% nas duas últimas semanas. Mas os fundamentos do mercado continuam negativos a médio prazo, pelo menos até que algo relevante aconteça na economia doméstica e seja capaz de trazer o capital estrangeiro de volta, afirmam analistas.
"Há uma grande chance de repique da Bovespa no curtíssimo prazo", diz o estrategista da Icap Brasil, Gabriel Gersztein, explicando que houve uma alta exagerada nos prêmios de risco nos últimos dias, além do forte recuo do Ibovespa. "Mas, estruturalmente, não vejo uma recuperação consistente da bolsa, porque os fluxos de capitais continuam negativos."
Na sexta-feira, o Ibovespa caiu 2,39%, para 51.618 pontos, menor patamar desde outubro de 2011.
Gersztein cita problemas internos, como o crescimento pífio da economia, mas afirma que o Brasil sofre também efeitos da "rotação global de portfólio", com o dinheiro migrando de mercados emergentes para desenvolvidos.
O especialista usa como referência os números da EPFR Global (consultoria que monitora o fluxo de capitais de fundos em todo o mundo). Segundo ele, os fundos referenciados em ativos brasileiros registram saída de recursos há 15 semanas consecutivas. Apenas na semana passada, os investidores sacaram US$ 528 milhões desses fundos. Em um mês, a saída alcança US$ 1,5 bilhão. E desde meados de fevereiro (15 semanas), o fluxo está negativo em US$ 4,3 bilhões. Gersztein diz que trata-se da segunda maior retirada desde 2009.
"A contínua saída de recursos nas últimas semanas está acontecendo junto com o aumento do risco Brasil", observa. O risco Brasil, por sua vez, está no maior patamar desde o início de 2012, auge da crise europeia. Na sexta-feira (7), o Embi+, calculado pelo J.P. Morgan, estava em 213 pontos, contra 206 no fim de maio, e 142 pontos no fim do ano passado. Desde o início do ano, o risco Brasil já subiu 50%.
Para o gestor dos fundos de renda variável para América Latina da BlackRock, Will Landers, a baixa de 15,3% do Ibovespa neste ano já embute muitos dos motivos que levaram a agência Standard and Poor"s (S&P) a mudar a perspectiva de risco de crédito do Brasil, de estável para negativa na quinta-feira.
Por isso, Landers afirma que não venderia ações brasileiras baseado no movimento da agência de classificação de risco. "Mas, se o crescimento do país não melhorar nos próximos trimestres, haverá mais espaço para queda no mercado de ações, embora esse não seja nosso cenário base no momento", disse.
De acordo com ele, o rebaixamento acendeu mais uma luz amarela. "Temos falado há um tempo que o maior risco ao mercado brasileiro este ano seria uma recuperação econômica fraca, o que até agora tem sido o caso", afirma.
Apesar disso, segundo ele, há sinais de melhora, como a desaceleração da inflação e um Banco Central mais ativo no front inflacionário. A mudança na perspectiva do rating pela S&P "deve servir como mais um alerta para o governo no sentido de que são necessárias mais reformas para reduzir o custo de se fazer negócios no Brasil, mais agilidade em projetos de infraestrutura que estão ficando fora do cronograma e mais atenção às contas fiscais", observa ele.