Até o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, caiu na real. Mesmo se esforçando para sustentar o discurso de que a inflação está e continuará sob controle, o chefe da autoridade monetária sinalizou ontem, na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal, ter consciência de que o cenário da alta de preços piorou apesar do aperto nos juros. A aposta do mercado é que na próxima reunião, em julho, o Comitê de Política Monetária (Copom) force a mão e ajuste ainda mais a taxa básica (Selic), hoje em 8% ao ano.
Há menos de um mês, também em visita ao Congresso, Tombini havia afirmado, categoricamente, aos parlamentares que a inflação acumulada em 12 meses começaria a cair no início do segundo semestre. Desta vez, ele não só evitou arriscar novo prazo para o freio na escalada dos preços como também reconheceu a tendência de elevação da carestia nos próximos meses.
Caso as previsões do mercado se confirmem, a inflação acumulada em junho voltará a romper o teto da meta do governo, de 6,5%. Este ano, isso já ocorreu em março, quando o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) chegou a 6,59%. Depois de amanhã, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulga o IPCA-15, a prévia do mês. O Itaú Unibanco estima alta de 0,39%, o que faria o indicador anual saltar para 6,69%, configurando o maior percentual em 19 meses.
O aumento das passagens de ônibus, considerado o estopim da onda de protestos que tomou conta do país, deve pressionar a inflação deste mês e tornar a situação ainda mais complicada. No texto lido ontem em 16 minutos a cinco senadores, Tombini tornou a culpar os alimentos pelos elevados níveis inflacionários, acima do esperado. "A intensidade desses choques (de oferta) sobre a dinâmica da inflação não foi desprezível", declarou.
Ao fazer questão de relembrar como a inflação estava um ano atrás no país — oscilando no centro da meta e em trajetória de queda —, Tombini deixou claro que, com um cenário bem menos favorável, o desafio de conter a carestia se intensificou. Problemas climáticos no segmento agrícola, atribuiu ele, tanto no Brasil como no exterior, reverteram a dinâmica em curso e fizeram com que a inflação aumentasse de patamar.
O discurso de Tombini deu a entender que o BC desistiu de sufocar a escalada dos preços no curto prazo, ao contrário do que, até o mês passado, o próprio presidente acreditava ser possível. "Mas posso assegurar que o Banco Central está vigilante e fará o que for necessário, com a devida tempestividade, para colocar a inflação em declínio no segundo semestre e para assegurar que essa tendência persista neste e nos próximos anos", insistiu ele.
Desconfiados
Ciente de que o povo e o mercado financeiro continuam desconfiados em relação ao controle da inflação, o chefe do BC destacou o ciclo de ajustes na taxa básica de juros iniciado em abril e intensificado em maio. "Essas e outras iniciativas se inserem no nosso entendimento de que o combate à inflação contribuirá para fortalecer a confiança dos brasileiros na economia", salientou. No Boletim Focus desta semana, o mercado projetou juros a 9% ao ano no fim de 2013.
Em dia marcado por novas intervenções da autoridade monetária para tentar segurar a alta do dólar, Tombini aproveitou a audiência pública para dar um recado aos investidores, dizendo que o Brasil está preparado para enfrentar "eventuais ventos contrários". Mesmo prevendo momentos de "trepidações" no mercado mundial de câmbio, ele reiteirou que o regime cambial do país é flexível e que o BC atuará quando considerar que há grande volatilidade.
Tombini afirmou, ainda, que "uma adequada condução da política monetária" ajuda a reduzir o repasse da desvalorização do real ante o dólar para a inflação. No início deste mês, o presidente do BC disse que a disparada do dólar em relação ao real teria impacto limitado na alta de preços.
» E EU COM ISSO
A tendência de alta de juros para tentar conter o avanço da inflação no país vai impactar ainda mais o já apertado orçamento dos brasileiros. Motivo: os empréstimos e os financiamentos vão encarecer, dificultando as compras a prazo e atingindo em cheio os gastos com cheque especial e cartão de crédito, que já cobram as maiores taxas do mercado. Não há dúvidas de que os bancos repassarão a conta do aperto promovido pelo Banco Central aos consumidores que se aventurarem a fazer dívidas.